sábado, 18 de outubro de 2008

As 37 Práticas de Todos os Bodhisattvas

De Gyalsé Thokmé Zangpo

O Mestre vê todas as coisas que estão para além do vai e vêm,
E mesmo assim luta incansavelmente para o bem dos seres vivos –
Meu precioso guru inseparável do Senhor Avalokita,
Com respeito eu vos presto homenagem perpétua, com o meu corpo, palavra e mente.

Os perfeitos budas, que são a fonte de todo o beneficio e alegria,
Aparecem como seres através da realização do Dharma sagrado.
E isso depende de saber como praticar o Dharma,
Eu vou descrever as práticas de todos os herdeiros legítimos dos budas.

1. A prática de todos os Bodhisattvas é estudar, refletir e meditar.
Incansável, tanto de dia como de noite, sem nunca cair na ociosidade,
para libertar a si e aos outros deste oceano do samsara,
Tendo ganho este supremo vaso corporal - uma vida humana favorável e livre, que é tão
difícil de encontrar.

2. A prática de todos os Bodhisattvas é deixar para trás a sua terra natal,
onde o apego à família e aos amigos nos subjuga como uma enxurrada,
enquanto a aversão aos nossos inimigos nos rói interiormente como um fogo escarlate,
e a escuridão ilusória nos eclipsa, ou seja, torna incompreensível a linha de conduta que
devemos seguir e o que deixar para trás.

3. A prática de todos os Bodhisattvas é ir regularmente a lugares solitários,
evitando o que não é saudável, para que as emoções destrutivas gradualmente desapareçam
e, na ausência de distrações, a prática virtuosa naturalmente se fortalece, avançando
rapidamente. Com a consciência atenta e focalizada, adquirimos convicção nos
ensinamentos.

4. A prática de todos os Bodhisattvas é renunciar a todas as preocupações da vida.
Durante muito tempo fizemos amizades e relacionamentos com familiares, e
agora todos nós temos que seguir caminhos separados;
Riquezas e bens tão penosamente adquiridos, devem ser deixados para trás;
E a consciência, a convidada que mora no nosso corpo, também um dia deve partir.

5. A prática de todos os Bodhisattvas é evitar amigos destrutivos,
na companhia dos quais os três venenos da mente ficam mais fortes.
E por causa deles cada vez estudamos, refletimos e meditamos menos,
e tanto o amor como a compaixão esmorecem, até se extinguirem.

6. A prática de todos os Bodhisattvas é estimar os amigos espirituais,[2]
pensando neles como ainda mais preciosos que o próprio corpo.
Pois são eles que nos ajudam a nos livrar de todos os defeitos,
e que fazem com que as nossas virtudes cresçam ainda mais,
tal como a lua crescente.

7. A prática de todos os Bodhisattvas é tomar refugio nas Três Jóias,
pois elas nunca deixam sem resposta os protegidos que a elas apelam.
Os deuses comuns do mundo não podem ajudar ninguém
enquanto eles próprios estiverem na armadilha
do ciclo vicioso do samsara, não é assim?

8. A prática de todos os Bodhisattvas é nunca cometer um ato prejudicial,
mesmo que isso ponha a sua própria vida em risco,
pois o próprio Sábio ensinou que as ações negativas
quando chega a hora nos levam às múltiplas misérias dos mundos inferiores,
tão difíceis de suportar.

9. A prática de todos os Bodhisattvas é lutar para atingir o seu objetivo,
que é o estado supremo imutável, a libertação eterna,
pois a felicidade dos três reinos dura um só momento,
e logo vai embora, tal como gotas de orvalho em colinas de ervas.

10. A prática de todos os Bodhisattvas é desenvolver o bodhicitta,
assim como proporcionar a liberdade a todos os infinitos seres sensíveis.
Como seria possível encontrar a verdadeira felicidade enquanto
as nossas mães que cuidaram de nós através dos tempo, carregam uma dor?

11. A prática de todos os Bodhisattvas é fazer uma troca genuína
da felicidade pessoal e bem estar por todos os sofrimentos dos outros.
Toda a miséria vem da procura da felicidade pessoal só para si,
enquanto o estado de buda perfeito nasce do desejo do bem dos outros.

12. Mesmo se outros, sob a influência de um grande desejo, roubarem,
ou encorajarem os outros a roubar todas as riquezas que tenho,
dedicar-lhes totalmente o meu corpo, bens e todos os meus méritos
do passado, presente, e futuro – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

13. Mesmo que os outros queiram cortar a minha cabeça,
embora eu nada tenha feito de mal,
tomar sobre mim, com compaixão,
todos os males que eles acumularam – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

14. Mesmo que os outros declarem a toda gente
montes de coisas desagradáveis sobre mim,
retribuir-lhes, falando somente bem deles,
com uma mente cheia de amor – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

15. Mesmo que os outros exponham os meus erros escondidos
ou digam horrores sobre mim, quando discursam em grandes conferências,
pensar neles como amigos espirituais e inclinar-se
ante eles com respeito – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

16. Mesmo que os outros, de quem cuidamos como se fossem filhos,
se voltem contra mim e me tratem como inimigo,
olhá-los com dedicação e afeto, tal como uma mãe olha o seu filho mal-humorado – esta é a
prática de todos os Bodhisattvas.

17. Mesmo se outros, iguais ou inferiores a mim em intelecto, nível espiritual ou riqueza
com arrogância, me desprezam, para os homenagear, tal como o faria ao meu mestre,
inclino a minha cabeça perante eles – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

18. Mesmo sendo desamparado e ignorado por todos,
fraco devido a uma terrível doença e importunado por espíritos malignos, ainda assim
tomar sobre mim todas as doenças de todos os seres e ações nefastas, sem nunca perder a
bondade do meu coração – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

19. Mesmo sendo famoso e reverenciado por todos,
e tão rico como Vaishravana, o deus da riqueza.
Ciente da futilidade de toda a glória e riquezas deste mundo,
não ser vaidoso – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

20. A prática de todos os Bodhisattvas é controlar a mente,
com as forças do amor generoso e da compaixão.
Pois, a não ser que o adversário real – a minha própria ira – seja derrotada,
Os inimigos exteriores, mesmo que os conquiste, voltarão a aparecer.

21. A prática de todos os Bodhisattvas é afastar-se imediatamente
das coisas que levam ao desejo e ao apego.
Pois os prazeres dos sentidos são tal e qual a água salgada:
Quanto mais os provamos, mais a nossa sede aumenta.

22. A prática de todos os Bodhisattvas é nunca alimentar conceitos,
que envolvam as noções dualistas de perceber e ser percebido,
sabendo que todas estas aparências são a própria mente,
cuja natureza intrínseca está para sempre
além das limitações das idéias.

23. A prática de todos os Bodhisattvas é não se agarrar a nada
E quando vê coisas que considera agradáveis ou desagradáveis,
Deve considerá-las como um arco-íris no céu de verão –
bonito na aparência, mas na verdade desprovido de qualquer substância.

24. A prática de todos os Bodhisattvas é reconhecer a ilusão,
sejam eles confrontados com a adversidade ou infortúnio.
E como esses sofrimentos são como a morte de uma criança num sonho,
é tão cansativo agarrar-se às percepções ilusórias tendo-as como reais.

25. A prática de todos os Bodhisattvas é ser generoso,
sem esperanças de recompensas cármicas ou expectativas de prêmios.
Pois se aqueles que buscam a iluminação até dão os seus próprios corpos,
será necessário mencionar simples objetos e bens exteriores?

26. A prática de todos os Bodhisattvas é respeitar uma ética restritiva,
sem a mínima intenção de continuar na existência samsárica.
Sem disciplina ninguém jamais terá certeza do próprio bem estar,
E assim qualquer pensamento de beneficiar os outros será absurdo.

27. A prática de todos os Bodhisattvas é cultivar a paciência,
livre de qualquer traço de animosidade contra alguém.
Qualquer fonte de mal é como um tesouro principesco
para o bodhisattva que deseja ardentemente usufruir da riqueza da virtude.

28. A prática de todos os Bodhisattvas é lutar com diligente entusiasmo –
a fonte de todas as qualidades – quando trabalham para o bem de todos os que vivem;
vendo que mesmo os shravakas e pratyekaBuddhas, que só se esforçam para eles próprios –
dedicam a ele todos os seus esforços, como se urgentemente tentassem extinguir fogos por
cima das suas cabeças.

29. A prática de todos os Bodhisattvas é cultivar a concentração,
que transcende superiormente as quatro absorções sem forma,
sabendo que as aflições mentais são ultrapassadas inteiramente
ao alcançar com esforço uma intuição interior, acompanhada por uma calma estável.

30. A prática de todos os Bodhisattvas é cultivar a sabedoria,
para além das três esferas conceituais, aliadas aos meios hábeis.
Não é possível atingir o nível perfeito do despertar só através
das outras cinco paramitas, sem a sabedoria.

31. A prática de todos os Bodhisattvas é examinar-se
continuamente e livrar-se dos defeitos, tão logo apareçam.
Pois a não ser que façamos a checagem cuidadosa da nossa própria confusão,
alguém que parece mostrar que pratica o Dharma na verdade opera contra ele.

32. A prática de todos os Bodhisattvas é nunca falar desfavoravelmente
dos que caminham no grande veículo,
pois se, sobre a influência das emoções destrutivas,
eu falar das quedas dos outros Bodhisattvas, o erro será meu.

33. A prática de todos os Bodhisattvas é abandonar o apego
aos patronos, à família e amigos,
pois o estudo, a reflexão e a meditação diminuem
quando discussões e competições por honras e recompensas aparecem.

34. A prática de todos os Bodhisattvas é evitar palavras duras,
que possam ser consideradas desagradáveis e detestáveis pelos outros,
porque a linguagem ordinária perturba a mente dos seres,
e arruina a conduta do bodhisattva.

35. A prática de todos os Bodhisattvas é eliminar o apego
e todas as outras aflições mentais, tão logo apareçam,
tomando como armas os remédios apoiados na atenção plena e na vigilância
pois uma vez que as kleshas se tornam familiares, são difíceis de evitar.

36. Resumindo, para qualquer coisa que façamos,
examinemos sempre a consciência da nossa mente,
sempre em estado de alerta e com atenção plena,
fazer o bem aos outros – esta é a prática de todos os Bodhisattvas.

37. A prática de todos os Bodhisattvas é dedicar-se a atingir o despertar.
Toda a virtude ganha ao esforçar-se nesse caminho,
com a sabedoria que purifica as três esferas conceptuais,
pode assim fazer desaparecer o sofrimento dos seres infinitos.

Aqui expus para aqueles que querem seguir o caminho do bodhisattva,
As 37 práticas que devem ser adaptadas pelos herdeiros legitimos dos budas,
Baseado nos ensinamentos dos sutras, tantras, e tratados,
E seguindo as instruções dos grandes mestres do passado.

Como a minha inteligência é pouca e pouco estudos fiz,
Este não é um texto que vá satisfazer os entendidos
Mas como confiei nos sutras e no que os santos ensinaram
Eu sinto que verdadeiramente estes são os treinos autênticos,
dos herdeiros legítimos dos budas

Mas, as ondas enormes da actividade dos bodhisattvas
São difíceis para a mente de uma pessoa simples como eu, de apreender,
E assim imploro a compreensão de todos os santos perfeitos
Por qualquer contradição, irrelevâncias ou outros falhas, nele contidas.

Através do mérito que ganhei, possam todos os seres,
Gerar o sublime bodhichitta, tanto relativo como absoluto,
E através disso, tornarem-se iguais ao Senhor Avalokiteshvara,
Transcendendo os extremos da existência e da imobilidade.

Este texto foi composto numa cave perto de Ngulchu Rinchen pelo monge Thokmé, um professor em escrituras sagradas e dialéctica, para o seu bem e dos outros.

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