sexta-feira, 14 de novembro de 2008

O padeiro e o monge

Havia um monge budista ocupando um templo, mas ele precisava viajar a uma cidade longínqua. Então, ele pediu ao vizinho para que cuidasse do templo na sua ausência. Esse vizinho era dono da padaria da localidade, e, como é natural, sendo o dono da padaria não sabia nada sobre as doutrinas budistas. Mas aceitou tomar conta do templo com muita boa vontade.
Logo depois da partida do dono do templo, um monge viajante chegou à aldeia. Naquela época existia entre os monges a tradição de debate verbal em relação aos seus entendimentos sobre o budismo. Quem ganhasse o debate ficava com o templo e quem perdesse tinha de ir embora. Chamava-se a isto uma batalha do Dharma. Hoje, este costume ainda existe. Com muito cerimonial mas ainda existe.
Bem, o sujeito ficou muito preocupado com a notícia da chegada do monge viajante, já que ele era apenas o dono da padaria. Mas o chefe da aldeia veio até ele e disse: “Você faz o seguinte: raspa a cabeça, coloca a roupa de monge e depois se senta contra a parede como fazem os monges. Você tem que se conscientizar de que está treinando o silêncio. Assim, não precisa falar. Se você não falar, nada será revelado.” “Ah, está combinado”, disse o dono da padaria. Assim ele fez e ficou esperando. O monge viajante chegou, começou a perguntar, mas o monge da padaria estava sentado, em silêncio. “Ah”, pensou o viajante, “ele está fazendo o treinamento do silêncio. Não pode quebrar o treinamento e isto tem que ser respeitado. Mas já que estou aqui com tempo, vou tentar me comunicar com ele através de gestos”. E fez um gesto querendo dizer: “como é que está o seu coração?” O da padaria respondeu com outro gesto: “o meu coração é grande como o oceano..” “Ah”, entendeu o viajante, ele respondeu “grande como o oceano, o universo inteiro”. Universo inteiro significa dez direções, os pontos cardeais, e mais o meio, e em cima e em baixo. E fez outro gesto querendo dizer: “e para viver neste mundo, nas dez direções, como é que eu posso viver?” “São importantes”, respondeu, gesticulando, o monge da padaria, “os cinco preceitos: não matar, não roubar, etc.” O monge viajante fez outro gesto: “Então, o que são os Três Tesouros, Buda, Dharma, e Sangha?” O dono da padaria respondeu, com gestos: “Está muito perto de você, não pode procurar longe. Está aqui”. Com esta resposta o monge viajante se assustou: “Ah, está certo, ele é um grande monge”, pensou. E foi embora. Logo depois, o chefe da aldeia chegou e perguntou ao dono da padaria: “O que foi que aconteceu que aquele monge foi embora?” “O monge viajante era muito doido, não é?” perguntou o dono da padaria. “Em primeiro lugar perguntou, com gestos, pelo pão da minha padaria. Por que é que era tão pequeno. Eu respondi, com gestos, querendo dizer: Não, é muito grande. Ele então me perguntou: Quanto custa o pão? Gesticulei querendo dizer. Cinquenta centavos. Aí ele perguntou: Abaixa para trinta centavos? Eu respondi com gestos: De jeito nenhum. E ele foi embora”.
Esta história é muito engraçada, mas é exatamente isto o que está acontecendo no nosso mundo. Estamos vivendo dentro da nossa consciência. O monge viajante está vivendo dentro das teorias budistas, do treinamento etc., mas o dono da padaria não, ele está é preocupado com a qualidade do pão, quanto é que ele vai ganhar. É assim que cada um vive o seu mundo. Seu mundo significa aquilo que cada um está depositando dentro de sua consciência. Cada um tem os seus Karmas, particulares e coletivos. Dentro de uma só pessoa estão mais de trinta bilhões de anos passados e as experiências estão depositadas como sementes. Estas sementes dependem de condições, e quando existem estas condições, elas brotam e a árvore aparece.

Um comentário:

Fernanda Belo disse...

Só vemos aquilo que podemos ver e vivemos dentro desta realidade una. É como se fóssemos mágicos, criamos um cenário ilusório dentro de outra ilusão... cada um com sua varinha mágica. Muito nteressante, adorei.
Fernanda Belo